Lei 14.994, de 09 de outubro de 2024 e suas principais alterações no crime de feminicídio.
O Brasil ocupa o 5° lugar no ranking de feminicídios na América Latina e Mato Grosso está dentre os Estados brasileiros em que proporcionalmente mais feminicídios são praticados. Porém, o Brasil possuía uma das legislações mais brandas entre os países na tipificação do feminicídio o que provocou a promulga ção da Lei 14.994, de 09 de outubro de 2024, para o endurecimento da pena do feminicídio, a previsão de causas especiais de aumento da pena e a reformulação do conceito legal de violência de gênero mais amplo do que o previsto na Lei Maria da Penha.
Após vários anos de vigência da Lei 11.340/2006, conhecida Lei Maria da Penha, a expectativa de que ela impulsionaria políticas públicas eficazes de pro teção à mulher em situação de violência, reduziria os índices de feminicídio e ou tros crimes graves foi gradualmente frustrada diante dos altos índices de violência contra mulheres apontados ao Brasil.
O feminicídio é uma forma especialmente grave de crime contra a vida da mulher em que se prevê pena mínima e máxima maior do que os crimes contra a vida em geral.
Com a nova Lei (14.994), o feminicídio passa a ser tipificado como crime autônomo (art. 121-A, do Código Penal), com pena e regulamentação espe cíficas, com o aumento de pena de 12 a 30 anos para 20 a 40 anos de reclusão. A criação de regra especial para o concurso de agentes (art. 121-A, § 3°, do Código Penal), com a comunicação das circunstâncias pessoais elementares do crime.
A própria Lei descreve as razões da condição do sexo feminino para a tipificação do feminicídio, nas hipóteses em que o crime envolva violência
doméstica e familiar contra a mulher; menosprezo ou discriminação à condição de mulher (art. 121-A, § 1°, incisos I e II do Código Penal).
A previsão das causas especiais de aumento de pena ao crime de femi nicídio (art. 121, § 2°, incs. I a V, do Código Penal) levaram em consideração a proteção à mulher gestante, aos “órfãos” do feminicídio, às crianças e adolescentes vitimadas e ainda mulher idosa, com deficiência ou com vulnerabilidade fí sica/mental. Também são previstas como causas especiais de aumento de pena o feminicídio praticado na presença física ou virtual de descendente ou ascendente da vítima, em descumprimento de medidas protetivas de urgência e para as quali ficadoras objetivas previstas nos incisos III, IV e VIII do § 2° do art. 121 do Código Penal.
Ademais, houve o recrudescimento do cumprimento da pena decorrente de condenação por crime de feminicídio, com a alteração ao art. 112 da Lei de Execuções Penais (Lei 7.210/84) para prever a progressão de regime de forma di ferenciada, após o cumprimento de 55% da pena, se o apenado for condenado pela prática de feminicídio, se for primário, vedado o livramento condicional (inc. VI A).
Recentemente, no julgamento do Recurso Extraordinário 1235340 com repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que a execução provisória da sentença decorrente de condenação pelo Tribunal do Júri é constitucional, com a possibilidade de execução imediata da pena.
Portanto, a prevenção ao feminicídio envolve um conjunto de fatores para romper o sistema sociocultural do patriarcado e a opressão às mulheres, o que vem sendo desenvolvido pela Rede de Enfrentamento à violência doméstica e fa miliar contra a mulher de Barra do Garças e Pontal do Araguaia, conhecida Rede de Frente, há mais de onze anos (criada em 15 de maio de 2013), não tendo a comarca de Barra do Garças (composta por seis municípios) registrado nenhum
feminicídio dentre os anos de 2014 a 2017, o que continua sob controle com nú mero reduzido de feminicídios por ano.
É importante destacar que contribui para este resultado na comarca de Barra do Garças, a estruturação e consolidação do Grupo Reflexivo de Homens, em funcionamento efetivo há uma década, além da Patrulha Rede de Frente-Mu lher Protegida, primeira patrulha do Estado de Mato Grosso e que serviu de refe rência para a estruturação de outras Patrulhas oficiais no Estado, conhecidas como Patrulha Maria da Penha, com a fiscalização efetiva do cumprimento das medidas protetivas deferidas às vítimas.
Por fim, convém registrar que a credibilidade do sistema punitivo tam bém é fundamental nesta luta pelo combate à violência contra as mulheres, onde haja um desestímulo à prática de delitos desta natureza.
Luciana Rocha Abrão David
Promotora de Justiça em Barra do Garças e membra da Rede de Frente